O que a tecnologia já oferece para você cuidar da saúde mental na pandemia
No momento em que finalizo este texto completo mais de quatro meses em quarentena. Há tempos não vejo meus parentes ou amigos próximos. Minha equipe de trabalho está atuando remotamente e todos os meus compromissos estão sendo feitos online, seja pelo computador, celular ou e-mail. Há muito tempo a vida presencial tem se resumido ao perímetro da minha casa, com poucas saídas para resolver questões emergenciais e de extrema necessidade.
Esse é um desafio que tem sido enfrentado por milhões de pessoas no Brasil e pela maioria dos países em todo o mundo. A pandemia de coronavírus e os esforços de isolamento social transformaram o nosso modo de viver, trabalhar, estudar e se relacionar. E mais do que abalar economias, trazer impactos sociais e também políticos, a pandemia e seus efeitos estão também influenciando uma dimensão quase sempre deixada de lado: a saúde mental.
Antes mesmo da crise, o Brasil já sofria nessa dimensão. Segundo dados da OMS, nosso país tem a maior taxa de pessoas com depressão da América Latina, são 5,8% da população, o que equivale a 12 milhões de pessoas. Isso sem mencionar o transtorno de ansiedade: somos o país mais ansioso do mundo –9,3% da população sofre com esse mal.
O que já era grave tornou-se ainda pior. Segundo uma pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) que teve a participação de 1.460 pessoas em 23 estados e todas as regiões do país, os casos de depressão praticamente dobraram e as ocorrências de ansiedade e estresse tiveram um aumento estarrecedor de 80%. Os dados me levam a crer que vivemos, também, uma pandemia de males relacionados à saúde mental.
E o que fazer em relação ao problema quando as perspectivas indicam a continuidade do isolamento social, o agravamento da situação econômica e do cenário político? Primeiro, entender que estar separado não significa estar isolado. Além disso, assumir que nunca foi tão importante estarmos atentos para a saúde mental e, com a ajuda da tecnologia, é possível enfrentar esse desafio que também atinge a todos nós.
Como usar a tecnologia para fortalecer a saúde mental?
O medo talvez seja o principal fator que agrava os casos de depressão e ansiedade. Medo de perder o emprego, de adoecer ou perder alguém querido. E com as fake news –tema que já discuti aqui–– esse sentimento pode crescer e, por vezes, tomar proporções que são irreais. Combina-se a isso o fato de que muitas pessoas estão distantes de entes queridos, têm a sorte –mas também o desafio– de permanecer em casa 24 horas por dia, assumindo tarefas de uma rotina que antes era muito diferente.
A tecnologia pode encurtar distâncias, garantir presença e acompanhamento e também conforto emocional. E concretamente, o apoio à saúde mental pode se dar por meio de três grandes estratégias: telessaúde, aplicativos para smartphones e mídia social.
Para promover o cuidado aliado às tecnologias, tem sido cada vez mais valorizado o trabalho das "e-mental health", empresas que atuam criando soluções para a saúde mental. Integrante da rede do BrazilLAB, a Psicologia Viva é uma delas. A startup vem atuando na área de telepsicoterapia, consolidando uma rede de psicólogos e profissionais de saúde mental e permitindo o atendimento online de qualquer lugar.
Com a pandemia, as healthtechs também têm se tornado cada vez mais importantes. Elas permitem o teleatendimento, acompanhamento de pacientes e, principalmente, acesso a informações confiáveis, transparentes e de qualidade. São exemplos de healthtechs a Universaúde e UpSaúde, que atuam com serviços de orientação sobre a pandemia, por exemplo, a partir de chats online disponíveis 24 horas por dia.
E há também tecnologias atuando em sintomas específicos que atingem à saúde mental: por exemplo, a insônia –caso da Sleepio–-, a "gestão" do estresse –como promete o aplicativo da Welltory–– e também ajudar pessoas que estão sozinhas durante o isolamento –como a Wysa e sua inteligência artificial.
Um grupo de pessoas está especialmente propenso a males como estresse e depressão: são as pessoas idosas, um dos grupos de risco, e que, por vezes, estão em isolamento social sozinhas em casa. E mesmo que a questão geracional possa ser um desafio para que esse grupo possa utilizar as tecnologias, ela já não é mais uma barreira intransponível.
As redes sociais, os aplicativos de comunicação – como o WhatsApp, por exemplo – têm sido ferramentas fundamentais para garantir a sociabilidade desse grupo. O estado de São Paulo, por exemplo, adaptou um de seus aplicativos e criou o Cérebro Ativo, especificamente para a população idosa: ainda em fase de testes, a ferramenta combina técnicas de gamificação, inteligência artificial e internet das coisas (IoT) para promover o cuidado da saúde mental da população idosa.
Outra iniciativa é o Vizinho do Bem, idealizada pela startup NokNox, e que busca criar uma rede colaborativa conectando pessoas dispostas a ajudar aqueles que precisam de ajuda, por exemplo, para ir ao mercado, farmácia ou para um passeio com o bichinho de estimação. E a Mais Vivida, uma plataforma que reúne voluntários dispostos a apoiar o grupo de pessoas idosas –inclusive, e principalmente, a como navegar no mundo da tecnologia.
Um desejo para o futuro
Um dos principais legados da pandemia talvez seja a atenção com a saúde mental. Nunca o tema foi tão discutido e recebeu tanta atenção, seja de especialistas, mas também do público em geral.
Desejo que esse possa ser um momento de reflexão sobre o autocuidado e a importância da saúde mental –que muitas vezes não recebe a mesma atenção que a física. Mas que também possa servir como uma experiência em que a solidariedade e o interesse coletivo sejam reconhecidos e valorizados.
E mais: os exemplos crescem e mostram como a tecnologia pode nos ajudar a estarmos mais conectados, ainda que distantes. Afinal, uma das lições que a pandemia trouxe é que não estamos ou sairemos desse desafio sozinhos.
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