Contra obesidade infantil, países já adotam games e inteligência artificial
Letícia Piccolotto
08/06/2019 04h00
O combate à obesidade vem sendo colocado como prioridade para governos em muitos países
No Chile, iniciativa Juntos Santiago lança mão de game lúdico onde as crianças passam por obstáculos e acompanham seus passos com pedômetros (medidores de passos). Um hospital de Orlando fez estudo onde descobriram que um treinador comportamental de inteligência artificial pode aconselhar adolescentes no controle de peso
A tecnologia, muitas vezes, é vista como uma grande culpada pela obesidade infantil –ligada ao uso de telas, impedindo as crianças de "brincar lá fora". De fato, a molecada de hoje é bastante experiente no assunto e domina videogames, smartphones e computadores. Aí pode estar, inclusive, um apoio para a mudança na saúde: com o uso de dispositivos, médicos, professores e pais podem melhorar os níveis de atividade das crianças e começar a reduzir a obesidade infantil.
Uma em cada dez crianças e jovens de cinco a 19 anos em todo o mundo são obesos. No Brasil, o Ministério da Saúde registra que, entre meninos e meninas de 5 a 9 anos, 33% já estão acima do peso e 15% são considerados obesos. Nesse ritmo, a estimativa é que a obesidade passe a atingir cerca de 11 milhões de pequenos brasileiros em 2025.
É uma questão complexa e triste –já que, pela primeira vez na história recente, uma geração poderá viver menos e com mais dificuldades clínicas que seus pais, apontam especialistas. Por isso, o combate à obesidade vem sendo colocado como prioridade para governos em muitos países com ações de estímulo ao aleitamento materno, incentivo à atividade física e mudanças de comportamento alimentar.
O Chile é um desses lugares. Com mais de 50% das crianças classificadas como obesas ou acima do peso, a capital Santiago percebeu que a obesidade infantil tem impacto no futuro da sociedade. A questão causa aumento no risco de condições crônicas, prejuízo ao aprendizado e na participação social –e tudo está ligado, resultando na incapacidade de muitos adultos. Esse era, então, um problema municipal importante de ser atacado.
Foi por isso que nasceu o programa Juntos Santiago, sucesso local e ideia que se tornou um case mundial após se tornar vencedora do concurso Mayors Challenge 2016, iniciativa da Bloomberg Philanthropies, instituição criada pelo empresário e político norte-americano Michael Bloomberg, ele mesmo um ex-prefeito (da cidade de Nova York).
O Juntos Santiago é uma abordagem inovadora que transforma a alimentação saudável e o exercício físico em um jogo. As crianças acumulam pontos em games lúdicos –onde passam por obstáculos como uma ilha de comidas artificiais e um abismo de produtos embalados -, acompanham seus passos com pedômetros (medidores de passos) e juntam suas famílias em eventos esportivos e atividades em prol da saúde.
Cada escola que adere ao programa recebe prêmios diferentes –como quadras de basquete ou uma parede de escalada, por exemplo. E, no final do ano, as escolas com mais pontos ganham um prêmio mais mais especial (esportivo, estimulante e próprio para afastar a obesidade da meninada).
Para as crianças, é apenas um jogo; para a cidade, a ideia é um salto de qualidade de vida e um terreno fértil para o futuro social. Por isso mesmo, a capital chilena só melhora o cenário: ainda em 2019, o Juntos Santiago deverá se expandir para 6.700 estudantes e atingir até 90% das escolas; ou, como dizem seus idealizadores, "a maior intervenção do mundo para prevenir a obesidade infantil".
Suporte e atenção tec
Pesquisadores do hospital Nemours, em Orlando, por exemplo, fizeram sua lição de casa contra a obesidade. Em um estudo publicado recentemente, eles descobriram que um treinador comportamental de inteligência artificial, apelidado de Tess, é viável e útil para o aconselhamento de pacientes adolescentes em um programa de controle de peso.
O estudo, publicado na revista Translational Behavioral Medicine, demonstra a disposição dos adolescentes e a reação positiva ao envolvimento em conversas de texto com o chatbot, que simula as interações humanas. Os pesquisadores observaram o benefício da natureza anônima da comunicação para melhorar a busca por ajuda e diminuição do estigma de ser uma criança obesa.
Por exemplo: um adolescente que ficou calado durante os encontros cara a cara com os pesquisadores trocou 425 mensagens com Tess para pedir conselhos sobre sua condição. São passos que a saúde pode e deve dar rumo à conquista de uma sociedade mais assistida em todas as idades. Eu, assim como muitas mães, agradecemos por esses avanços e pesquisas.
Sobre a autora
Letícia Piccolotto é mestre em Ciências Sociais, especialista em Gestão Pública pela Harvard Kennedy School e fundadora do BrazilLAB, a única plataforma brasileira que conecta startups e governos para estimular a inovação no setor público.
Sobre o blog
Acelerar ideias e estimular uma cultura voltada para a inovação do setor público. Este é um blog para falar de empreendedores engajados em buscar soluções para os desafios mais complexos vividos pela sociedade brasileira.