Topo

Letícia Piccolotto

Preservar o ambiente também passa por investir em tecnologia nas metrópoles

Letícia Piccolotto

28/09/2019 04h00

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, nove em cada dez pessoas, hoje, respiram ar poluído – e 7 milhões de indivíduos morrem a cada ano pelo impacto da poluição do ar (Foto: Unsplash)

Alguns dias atrás, em Nova York, uma garota de 16 anos roubou a cena de líderes de Estado no evento "Climate Action Summit 2019", proposto pela Organização das Nações Unidas, ao mostrar toda sua preocupação com as mudanças climáticas e o futuro das novas gerações. A sueca Greta Thunberg se tornou uma voz importante nesse ambiente de poder provocando reflexões sobre o quanto é de fato possível conciliarmos desenvolvimento econômico com a sustentabilidade do planeta. 

Muitos se sentiram tocados pela mensagem da garota, outros acharam que o tom foi exagerado, mas o fato é que, se pararmos para pensar, todos nós seremos impactados pelas mudanças climáticas de alguma maneira. A ONU prevê um aumento de até 3,4 graus ao final deste século – o que significa um desequilíbrio da biodiversidade e das condições climáticas, riscos de escassez de recursos, como a água e alimentos, e impactos relevantes em regiões polares e nos oceanos. 

Em seu discurso, a adolescente criticou os líderes mundiais por sua traição aos jovens e a inércia diante da crise climática – além do não cumprimento de compromissos para enfrentar os perigos do aquecimento global. "Os olhos de todas as gerações futuras estão sobre vocês. E se optarem por falhar conosco, eu digo que nunca iremos perdoá-los", disse ela.

O papel das cidades

Dentro desse contexto, um olhar importante frente às ações para reverter esse cenário diz respeito à forma como as pessoas se locomovem nas cidades. Até 2050, mais de 70% da população global viverá em centros urbanos. Essas cidades consomem entre 60% e 80% da energia total produzida no mundo e são responsáveis pela emissão de 75% do total de carbono emitido. Além disso, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), nove em cada dez pessoas, hoje, respiram ar poluído – e 7 milhões de indivíduos morrem a cada ano pelo impacto da poluição do ar. 

Mesmo com tantas tecnologias e com tantas startups trazendo disrupção para as cidades, como as famosas UrbanTechs – Uber, Waze, 99, Cabify, entre outras – a verdade é que ainda continuamos extremamente dependentes de veículos de uso individual. Essa dependência têm grande responsabilidade na emissão de carbono e, consequentemente, na qualidade do ar. Cidades como São Francisco, Boston e Los Angeles, todas nos EUA, já discutem a questão de aumento nos congestionamentos (e portanto da poluição) devido ao sucesso dos serviços ao alcance de um clique.

Em São Paulo, um novo estudo do Instituto de Energia e Meio Ambiente comprova que a poluição gerada por carros é proporcionalmente maior à gerada por outros modais. O ônibus emite mais poluentes que o carro, mas o veículo coletivo transporta centenas ou milhares de pessoas por dia. Assim, quem anda de ônibus ainda polui menos do que quem anda de carro. Se adotássemos de fato uma política pública eficiente para o transporte coletivo, a qualidade de vida em São Paulo melhoraria muito.

Tecnologia a favor do transporte coletivo 

As transformações causadas pelas UrbanTechs podem ser tanto positivas quanto negativas. Com um olhar positivo, isso é sentido principalmente quando pensamos no uso plural desses modais, como as configurações coletivas tipo Uber Juntos ou Waze Carpool. 

Um estudo de 2017 mostrou que os motoristas de apps atenderam 35 milhões de passageiros em viagens compartilhadas (ou seja, com mais de um passageiro) nas cidades onde esse serviço está disponível. Se essas pessoas tivessem dirigido sozinhas em seus carros, teriam sido mais de 82 mil toneladas de emissões de dióxido de carbono no ar.

Outra startup interessante que nasceu com esse enfoque é a Moovit. Fundada por Uri Levine, um dos criadores do Waze, essa startup ajuda o usuário a encontrar o melhor transporte público para o seu deslocamento. Nas palavras de Levine, "o maior problema hoje é a proporção entre número de passageiros e veículos. Uma única pessoa, dentro de um carro, ocupa um espaço enorme e é isso que gera os engarrafamentos. A maneira de mudar isso é criar transportes públicos muito melhores do que temos hoje. Esse é o futuro da mobilidade". 

Justamente por ser um problema crítico para a nossa sociedade e que passa pela atuação e liderança do poder público, este ano uma das verticais do programa de aceleração do BrazilLAB foi pensada para encontrar soluções e tecnologias capazes de apoiar governos na promoção de uma mobilidade urbana mais digna, eficaz e sustentável. Startups e GovTechs do mundo inteiro podem aplicar suas soluções até o dia 18 de novembro. As escolhidas receberão apoio para modelar suas soluções de mobilidade em cidades parceiras, investimento de até R$ 250 mil reais e uma viagem ao Vale do Silício para intercâmbio de melhores práticas. 

Com investimentos, adoção de novas tecnologias, abertura do setor público e articulação entre diferentes setores da sociedade para a aplicação de soluções eficazes, nosso trânsito e nosso clima se tornarão muito melhores. Como cobrou Greta Thunberg em sua fala, temos uma enorme responsabilidade hoje perante às novas gerações. 

Sobre a autora

Letícia Piccolotto é mestre em Ciências Sociais, especialista em Gestão Pública pela Harvard Kennedy School e fundadora do BrazilLAB, a única plataforma brasileira que conecta startups e governos para estimular a inovação no setor público.

Sobre o blog

Acelerar ideias e estimular uma cultura voltada para a inovação do setor público. Este é um blog para falar de empreendedores engajados em buscar soluções para os desafios mais complexos vividos pela sociedade brasileira.