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Letícia Piccolotto

Mãe e empreendedora: elas controlam R$ 148 tri, mas ainda lutam por espaço

Letícia Piccolotto

11/05/2019 04h00

Quando se fala em empreendedorismo na tecnologia, a presença das mulheres (e mães) continua sendo um desafio – e a divisão de homens-mulheres nesse mercado segue em 70%-30% (Foto: Freepik)

Se olharmos os números, nunca foi uma época tão boa para empreender. No Brasil, nos últimos dez anos, passamos de 14 para 49 milhões de pessoas que pensam em abrir um negócio próprio. Desafios? Existem aos montes. Mas e se o empreendedor for uma mulher, gênero que lidera apenas 30% do mercado? Aí, eles serão ainda maiores.

Imagine, então, ser empreendedora e mãe — conciliar a criação dos filhos com o desafio de resolver um problema complexo e tirar uma empresa do papel? Felizmente, estamos vendo cada vez mais exemplos de mães empreendedoras no mundo.

Essas mulheres estão atuando em diferentes setores, seja empreendendo para resolver e otimizar desafios do próprio dia a dia (como a startup HopSkipDrive, uma espécie de Uber para crianças, que nasceu da demanda de três mães que estavam enlouquecendo com o desafio de conciliar o trabalho e a rotina de levar e buscar seus filhos em atividades externas como natação, balé) ou em áreas extremamente técnicas, como o caso da startup 23andMe, que trabalha com testes de DNA a preços acessíveis.

Dados do estudo anual Global Wealth Report mostram que a força feminina não pode ser menosprezada. Globalmente, as mulheres do mundo controlam US$ 36 trilhões (mais de R$ 148 trilhões, na conversão direta) e são responsáveis por 70% das decisões financeiras dentro de casa. Além disso, elas representam, hoje, uma parcela importante da população quando falamos de tendências e consumo.

No entanto, quando se fala em empreendedorismo no setor da tecnologia, especificamente, a presença das mulheres (e mães) continua sendo um desafio. Vem melhorando, conforme os exemplos citados, mas ainda é de se pensar por que a divisão de homens-mulheres nesse mercado circula na proporção 70%-30%. No BrazilLAB, hub de aceleração de startups voltado à inovação no setor público, se nota o mesmo.

Em seus três anos recém-completos de atuação, o BrazilLAB contabilizou mais de 2 mil startups — 1/3 de empresas fundadas e comandadas por mulheres. Fica claro, no entanto, que basta surgirem oportunidades para que as executivas mostrem seus valores. E uma forma de viabilizar esse incentivo são programas específicos para que elas sejam recebidas no mercado tech ou acolhidas para encontrarem modelos mais flexíveis dentro da rotina de trabalho.

Abre-se oportunidades para elas

A companhia Mastercard, por exemplo, mantém o Girls4Tech, programa de educação em tecnologia para meninas em diversos países da África, na América do Sul (incluindo Brasil) e nos Estados Unidos. A vice-presidente de tecnologia da empresa, Dana Lorberg, classifica como "uma oportunidade de promover uma transformação geracional".

Outra iniciativa interessante é o Campus for Moms, do Google. Presente em diferentes países onde a companhia mantém um campus próprio para fomentar o ecossistema empreendedor. A iniciativa combina um espaço dedicado para as mães trabalharem enquanto os filhos brincam – e há uma série de palestras e oficinas 100% voltadas às mulheres.

Quando uma mulher decide empreender, as metas não são alcançadas da noite para o dia – inclusive porque muitas de nós, mesmo nos dias modernos de hoje, precisamos levar em conta uma dupla ou até tripla jornada de trabalho. É uma realidade que eu conheço bem sendo mãe de três filhos.

Quando criei o BrazilLAB, a Clara tinha cinco anos e a Sofia apenas um. Hoje, depois de três anos de atuação, já sou mãe também do Vinícius, que acabou de completar 5 meses. Vivo todos os dias o desafio de conciliar a maternidade com a vida empreendedora. Já fiz reuniões por conferência amamentando, já apelei para a televisão quando tinha que me concentrar em algum material complexo e já me vi diversas vezes iniciando o terceiro turno de trabalho madrugada adentro, após colocar as crianças para dormir.

Acredito que muitas mães que trabalham se identificam com as situações acima. Não é fácil. Mas o que mais motiva a continuar, mesmo sendo tão difícil, é a certeza de estar deixando um legado para os meus filhos: além de um Brasil melhor, espero servir de exemplo também para as futuras gerações de mulheres empreendedoras.

Sobre a autora

Letícia Piccolotto é mestre em Ciências Sociais, especialista em Gestão Pública pela Harvard Kennedy School e fundadora do BrazilLAB, a única plataforma brasileira que conecta startups e governos para estimular a inovação no setor público.

Sobre o blog

Acelerar ideias e estimular uma cultura voltada para a inovação do setor público. Este é um blog para falar de empreendedores engajados em buscar soluções para os desafios mais complexos vividos pela sociedade brasileira.