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Letícia Piccolotto

O que já está sendo criado para construir as cidades do futuro brasileiras?

Letícia Piccolotto

22/02/2020 04h00

Para construir cidades do futuro é preciso começar hoje (Pixabay)

Na última semana a consultoria Macroplan publicou os resultados da pesquisa anual "Desafios da Gestão Municipal", que analisa as 100 maiores cidades brasileiras – municípios com mais de 273 mil habitantes – e que resultou na construção de um índice para avaliar as dimensões de saneamento e sustentabilidade, saúde, educação e segurança. Em cada uma delas, foram analisados indicadores que descrevem a situação das cidades – por exemplo, esgoto tratado, taxa de homicídios, mortalidade infantil e o desempenho dos estudantes no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).

Os resultados do Índice de Desafios da Gestão Municipal (IDGM) demostram os efeitos da crise que temos vivido: embora a série histórica dos últimos 10 anos aponte avanços positivos, a análise do último ano indica que houve piora no desempenho em quase metade das cidades analisadas – especialmente nas áreas de saúde e segurança.

Piracicaba, cidade do interior de São Paulo, ocupa a primeira posição no ranking geral. As demais colocadas foram: São José do Rio Preto (SP), Maringá (PR), São José dos Campos (SP) e Jundiaí (SP). A pesquisa traz conclusões sobre a importância das cidades, as disparidades entre as regiões do país, além de insights sobre as medidas necessárias para transformar as zonas urbanas em melhores espaços para vivermos.

As cidades são essenciais para o país. Segundo dados do IBGE de 2015, quase 85% da população brasileira vive nesses espaços, e elas são responsáveis por grande parte da produção econômica e pelo acesso a serviços públicos e privados que podem garantir a qualidade de vida das pessoas.

Também é verdade que os desafios enfrentados por quem reside nas cidades são gigantescos. Na semana passada, aqui mesmo na região metropolitana de São Paulo, vivemos momentos de grande tensão. Uma tempestade provocou o transbordamento de rios, o deslizamento de terras e transformou a dinâmica da cidade por vários dias. Essa cena, vivida em São Paulo e outras metrópoles do país, infelizmente, já não é novidade.

E tampouco há somente um motivo para que isso aconteça já que, como todo problema complexo, vários fatores estão envolvidos – desde o processo de urbanização desordenado até o baixo acesso aos serviços de saneamento básico.

Embora o cenário seja extremamente complexo, os resultados da pesquisa "Desafios da Gestão Municipal" demonstram que há experiências de sucesso entre as cidades brasileiras, nas quais a gestão pública tem como foco melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, ao mesmo tempo em que se torna mais eficiente. Para isso, a tecnologia cumpre um papel essencial.

A cidade de São José dos Campos, uma das primeiras colocadas no ranking, é um bom exemplo de como a agenda de governo digital tem contribuído para a melhoria dos serviços públicos. A gestão municipal tem implementado a solução Gesuas – que foi acelerada pelo BrazilLAB – e hoje está presente em todas as regiões do país com mais de um milhão de usuários ativos. O sistema permite otimizar a gestão dos serviços da assistência social, trazendo maior agilidade e precisão nas informações.

(Pixabay)

Soluções digitais que estão surgindo

Um dos temas trabalhados no 4° ciclo do Programa de Aceleração do BrazilLAB é Smart Cities e Urban Techs. A partir desta vertical, buscamos startups que apresentem soluções para construir cidades mais sustentáveis, justas e eficientes.

Uma dessas soluções foi apresentada pela Sipremo, startup que desenvolveu uma inteligência artificial capaz de prever quando, onde e qual evento meteorológico ou desastre natural pode acontecer em determinada região – e o melhor, com horas de antecedência.

Outra startup acelerada pelo BrazilLAB e com solução para a gestão das cidades é a CityTech, que criou a Urban Insights, uma plataforma de deep learning – que é um tipo de inteligência artificial – para conseguir interpretar o que uma cidade "sente" por meio das manifestações dos próprios cidadãos. Para isso, ela aproveita as manifestações e opiniões publicadas nas redes sociais – como Twitter, Facebook, blogs, entre outras – para medir e gerar insights que possibilitam aprimorar os serviços públicos.

E há também a Atman Systems, startup que atua no gerenciamento de trânsito, controle de tráfego e mobilidade urbana. Sua solução, a Attlas, já foi implementada em quatro estados brasileiros e, a partir do uso de inteligência artificial, pode gerenciar o tráfego de veículos com base em informações de sensoriamento produzidas em tempo real. Na prática, são semáforos inteligentes que podem alterar a sua programação para responder, por exemplo, a eventos pontuais e inesperados que influenciam o fluxo de carros. Uma excelente ideia para uma cidade que tem 7,4 veículos para cada 10 habitantes – como é o caso de São Paulo.

Mais do que nunca, a pauta das cidades deve estar na agenda dos governos, da sociedade e da iniciativa privada. A tendência é que a vida nas zonas urbanas se torne cada vez mais complexa e excludente, caso não sejam realizadas mudanças na forma como se faz a gestão dos recursos e das demandas das grandes metrópoles.

A boa notícia é que para essa árdua tarefa, as tecnologias digitais e a inovação aplicadas ao governo são poderosas ferramentas para aprimorar a gestão das zonas urbanas: elas ampliam a disponibilidade de dados, permitem o monitoramento contínuo dos serviços, além de fortalecer a capacidade de atendimento, a simplificação dos processos e o aprimoramento da qualidade e da agilidade dos serviços públicos.

Sobre a autora

Letícia Piccolotto é mestre em Ciências Sociais, especialista em Gestão Pública pela Harvard Kennedy School e fundadora do BrazilLAB, a única plataforma brasileira que conecta startups e governos para estimular a inovação no setor público.

Sobre o blog

Acelerar ideias e estimular uma cultura voltada para a inovação do setor público. Este é um blog para falar de empreendedores engajados em buscar soluções para os desafios mais complexos vividos pela sociedade brasileira.